segunda-feira, 28 de junho de 2010

Já faz anos...



Já aceitei que amo você. Aceitei que eu serei uma daquelas pessoas que aos 70 anos, mesmo casada, com filhos e netos, sonha em reencontrar seu amor de verdade, seu primeiro amor, aquele que ainda lhe tira noites de sono e a quem dedica suspiros profundos no café da manhã. Serei aquela doce senhora que ainda pensa no amado ao ouvir certas músicas, assistir a certos filmes e dar, escondida, o último trago no cigarro.

E pensarei em você ao regar as plantas, ao fazer bolinhos de chuva, escrever receitas e levar o bebê para passear no parque. Imaginarei você, como estará, onde estará e com quem. Verei o seu rosto ainda novo em todo e qualquer senhor que passar pela minha frente e ensaiarei na frente do espelho o que falaria a você quando nos encontrássemos.

Ficarei esperando notícias, um e-mail, um cartão. Darei um jeito de saber a quantas anda sua vida e farei milhares de promessas a fim de te encontrar por aí, por acaso ou não. Saberei que só você poderia me fazer feliz e me arrependerei todos os dias de ter te deixado partir. Ficarei a indagar a mim mesma se você ainda pensa em mim e me darei por satisfeita sempre que, por a+b, chegar a uma resposta positiva. E terei certeza de que a todo momento que sentir o seu perfume - que nunca terá saído de minha memória - é porque naquele exato segundo você também se lembrou de nosso passado e sentiu saudades.

Serei a que acordará toda manhã e olhará para o lado ainda esperançosa, querendo que seja você o corpo já meio velho estendido ao lado. Querendo ser o corpo já meio velho estendido ao seu lado, ao lado do homem que tem certeza que é o homem de sua vida.

A.

domingo, 23 de maio de 2010

Quando? Foi num domingo à tarde...


Num café com amigas numa tarde de domingo cheguei a uma conclusão: “Love isn't enough if there's no commitment. Commitment isn't enough if there's no love”. Simples assim. Acho que durante muito tempo acreditei que amar alguém era motivo suficiente para que todas as barreiras da vida desabassem e todos os acasos fizessem com que o amor fosse possível e concretizado.

Acho que andei assistindo a muita comédia romântica. Jesus! Estava andando com um óculos cor de rosa e achando que o mundo era assim...bonito! Mas o problema não é esse, o problema é que o óculos cor de rosa fez meu mundo ficar cinza. Achando que os romances atingiam a perfeição e que o amor ultrapassava distâncias, fiquei por esperar uma realidade nunca alcançada. Cansei.

O amor existe. Existia, talvez seja a palavra correta, não importa. O amor estava lá e não superou a distância, a cobrança, a dúvida. Love with no commitment. De fato, não é suficiente.

Lá estou eu, numa manhã gelada e mau humorada de segunda feira. Sento no ônibus e começo a ler o livro que já era para ter sido terminado há muito tempo. Uma amiga entra no ônibus e todo o meu mau humor e frio e concentração desmoronam. “Viu o orkut dele?” ela pergunta. E sem nem esperar uma resposta de fato, só pela cara de ponto de interrogação, imenda: “achei que tivesse visto. Ele postou fotos com a garota. Agora parece ser oficial, com beijos e presentes e declarações. Ela nem é feia não, viu¿ É bem ajeitadinha até. Achei que tivesse visto as atualizações.” Era uma segunda feira, não era nem 5 horas da manhã, fazia muito frio, eu estava lendo. Algumas pessoas simplesmente não têm noção.

Me fiz de desinteressada e fingi estar com sono. Peguei o meu iPod e fingi dormir. Passei o caminho todo olhando o dia amanhecer, os ensaios de raio de sol batendo nas folhas, depois prédios, concreto, carros e finalmente pessoas me acalmava de um jeito que jamais saberei descrever. O iPod, que nessas horas sabe muito bem o que seu dono sente e faz questão de representar em músicas esse saber, mesmo no shuffle, tocava a canção mais adequada (ou menos, dependendo do ponto de vista).

Chorei. A cada moto, cada UNO e a cada casal que passava. Chorei. Mas as lágrimas dessa vez eram diferentes, eram doces. Acabou. Não tenho mais motivos para alimentar nenhum tipo de esperança. Não me procura mais, está com outra, está feliz. Foi quase como um alívio.

Foi então que me dei conta que não daria mesmo certo. Não há comprometimento. Eu não faria maiores esforços. Você faria. Você fez, mas não há amor. Não adianta, não é suficiente. Nunca será. “Love isn't enough if there's no commitment. Commitment isn't enough if there's no love”.

A.

domingo, 18 de abril de 2010

Amor de todos

E lendo esses versos, entendo que não sou só eu, que não estou sozinha.
Escreveu como se tirasse do meu peito todas as palavras, todas as vírgulas, o ponto final. Mas eram experiências dele próprio. E de outros. Por mais que iguais, não me pertenciam.
Não sou só eu, não estou sozinha. O amor é um (sentimento) sofrimento universal, não é privilégio meu.

"Ah, fumarás demais, beberás em excesso, aborrecerás todos os amigos com tuas histórias desesperadas, noites e noites a fio permanecerás insone, a fantasia desenfreada e o sexo em brasa, dormirás dias adentro, noites afora, faltarás ao trabalho, escreverás cartas que não serão nunca enviadas, consultarás búzios, números, cartas e astros, pensarás em fugas e suicídios em cada minuto de cada novo dia, chorarás desamparado atravessando madrugadas em tua cama vazia, não conseguirás sorrir nem caminhar alheio pelas ruas sem descobrires em algum jeito alheio o jeito exato dele, em algum cheiro estranho o cheiro preciso dele." Caio Fernando Abreu

A.

domingo, 11 de abril de 2010

Fechando e abrindo a geladeira a noite inteira

Numa noite dessas em que recostar a cabeça no travesseiro é o mesmo que se lançar à guilhotina, preferi não dormir.

Os pensamentos a seu respeito me atormentavam e para qualquer lugar que fosse, longe ou perto, me acompanhavam.

Perturbada, passei a noite subindo e descendo as escadas, variando entre meu quarto e a cozinha e então, num gesto desesperado de colocar para fora tudo aquilo que me enchia de angústia e dor, num pedaço de papel toalha, com a caneta de marcar o que precisa comprar no supermercado, escrevi:

“E eu, que por medo evitava o seu sorriso, me perdi no teu olhar.
Em ambas as situações, vamos olhar para trás e lembrar deste momento. Dessa conversa. Eu vou querer nunca ter falado isso, ter deixado rolar. Você vai querer ter dito alguma coisa, interferido, não ter deixado acabar.
E nós dois vamos seguir nossas vidas mesquinhas e completamente normais sem nunca amar de novo como amamos um ao outro e sempre se perguntando se se nos encontrássemos pela quarta vez daria certo.
Mas você jamais abandonaria sua cidadezinha praiana e eu jamais a cidade grande.
Saberíamos que encontramos o amor das nossas vidas, mas que o deixamos passar por medo, insegurança e egoísmo.
Eu vou sempre procurar um marido mais bonito, que me dê filhos loiros e um apartamento em Nova York e você vai sempre procurar a mulher que cuide da padaria enquanto você surfa.
E de tanto procurarmos a nós mesmos em outras pessoas, vamos nos perder. Para sempre.”

A.

sexta-feira, 9 de abril de 2010

Eu ontem, olhos de hoje. Eu hoje, olhos de amanhã.


Fiquei um tempo afastada dos teclados do computador. Minto. Na verdade tenho um longo e bem direto contato com eles todos os dias, mas eles têm estado bem longe do meu coração e dos meus pensamentos.

Acho que o que se passa na minha cabeça e os sentimentos que andam comigo são tão complexos, confusos e nublados que era praticamente impossível transformá-los em palavras. O meu eu interior pode ser comparado, atualmente, ao tempo que está fazendo em São Paulo há mais ou menos uma semana. As nuvens incobrem o céu o dia todo, mas em pequenos e raros momentos é possível enxergar alguns pontos azuis na imensidão do horizonte e chega-se, inclusive, a pensar que o sol vai sair de novo, tornando o dia dia de novo, claro, límpido. Mas, como já mensionado antes, eram só mesmo alguns pontos, pequenos pontos, e não aconteciam a todo momento.

Tenho achado mais graça nas apresentações de power point que tenho que fazer para os trabalhos de faculdade do que a maioria das conversas com amigos. Acho todo mundo muito criança e percebo com muito mais clareza a futilidade com a qual as pessoas levam suas vidas. Meus melhores amigos nesses tempos tórridos e estranhos tem sido os livros. E não sei o que isso significa. Acho que estou crescendo. De novo. A primeira vez que de fato tive essa sensação foi há, aproximadamente, cinco anos. Voltava de intercâmbio e, numa confusão que não tenho como descrever, no alto dos meus apenas 16 anos de idade, sabia que estava ficando diferente. Olhava para tudo com outros olhos, os mesmo olhos, mas outros. Era estranho. Ao entrar no meu velho quarto, apenas pouco mais de seis meses depois de partir, não reconhecia a pessoa que gostava daquele rosa gritante nas paredes, que vestia àquelas roupas presentes no armário, que tinha bichinhos de pelúcia e cartinha de amigos espalhados pelo mural. Amigos. Esses não conseguiam entender. Eu também não conseguia e, consequentemente, não sabia explicar. Poderia até ter tentado. Seria em vão. Me afastei.

Não tinha mais paciência com aquelas mesmas pessoas, não ria mais daquelas mesmas piadas, não fazia questão de nada. Crise, crise e mais crise. Foi assim durante um ano inteiro. Com o corpo num país e o coração no outro. Quando confusa, não sabia o porquê. Hoje sei: estava crescendo.

Amadurecer é difícil. Mesmo porque, não fazemos isso ao mesmo tempo que nossos amigos, irmãos e namorados. Estamos mudando, não nos reconhecemos mais. Muito menos a eles.

Acho que passo por essa fase novamente. Não tenho mais paciência para comportamento adolescente e jovem demais. Nunca fui uma pessoa de balada. Nunca gostei de sair com o intuito de ver gente bêbada beijando na boca de outros cidadãos bêbados dos quais não sabem nem o nome, dançando uma música que, na maioria das vezes, não faz o menor sentido e tendo que berrar para conseguir fazer algum comentário até desistir e ficar em silêncio. Até o fim da noite. Os meus programas favoritos sempre foram ir à casa de algum amigo, me dar ao luxo de comer e beber à vontade e desfrutar de uma boa, longa e, de preferência, filosófica conversa à luz do luar e ao som de algo bem calmo, tranquilo e que não estivesse na moda.

É óbvio que ser assim aos 16 anos de idade era o mesmo, ou até pior, que ser um ET. Assim sendo, guardava para mim e para mim apenas essa minha verdadeira identidade. Me forçava a sair e fingia que estava gostando. Mas não tinha jeito. Barzinho, tudo bem, adorava. Ainda gosto, acho válido. Pessoas novas, grande possibilidade de conhecer alguém, mas com a possibilidade de tomar algo sentado, conversando e ouvindo algo a que se pode chamar de música. Mas balada não. Não dava. Sempre era a primeira a sentar no sofazinho com a desculpa de dor nos pés por causa do salto alto demais para quem nunca os usa ou de estar bêbada demais (o que era sempre mentira). Tá aí, nunca gostei de ficar bêbada demais. Gosto de caipirinha de saquê (com lima) por causa do gosto e admiro um bom vinho. Cerveja só quando está muito calor e de preferência Heineken, nada muito doce. Fora isso, tomar àqueles líquidos a quem têm coragem de chamar “vodka” com algum nome de mulher e a preço de banana só para “ficar muito louco” e ainda por cima acordar no dia seguinte como se tivesse sido atropelada por um caminhão (duas vezes e em cheio) não era muito a minha praia. Continua não sendo.

Ser diferente de todos os meus amigos e, aparentemente, de todos os cidadãos comuns da minha idade me incomodava profundamente. Mas era algo a que eu não conseguia controlar. Inventava, então, desculpas como “minha mãe não deixa”, “estou sem grana” ou a famosa “moro muito longe” e até “acordo muito cedo” e ia dormir, metade frustrada, metade aliviada.

Acho que hoje (e hoje me refiro ao dia de hoje. Mesmo. Não sei de amanhã.) consigo me entender. Talvez não consiga entender a mim mesma na atual conjuntura, na nova fase. Mas entendo o “eu” de alguns anos atrás. E isso já é um belo começo.

Mas voltando ao começo do texto e o, a princípio, foco principal: acho que estou mudando. De novo. E quem sabe daqui a uns 5 anos eu não venha a discorrer sobre esse fato começando com “no alto de meus apenas 20 anos de idades...”. Quem sabe.

A.

terça-feira, 16 de março de 2010

Os muitos "você" que causam efeitos em um só "eu"

“Ele tem um poder sobre mim que não sei explicar. Ele me desespera”. Foi assim que te defini para uma amiga hoje, como um alguém que consegue fazer de mim e comigo o que poucos, ou quase nenhum, conseguem. Não te entendo. Não entendo mais o que quer comigo. Essa sua bipolaridade, sua mania de dizer sim quando quer dizer não e vice-e-versa me confunde demasiadamente.

Hoje você veio falar comigo. De novo. E veio para desmarcar nosso compromisso. Aquele compromisso, o que eu inventei para poder te rever. E pronto, nosso reencontro vai ser adiado por, pelo menos, um mês. Às vezes tenho certeza de que é o próprio destino mudando todos os caminhos e brincando comigo quando tento controlá-lo. Mas, por mais incrível que pareça, não sei se acho isso bom ou ruim. Penso que talvez não seja mesmo a hora de eu te ver, cara a cara, e vejo nisso um pretexto para continarmos nos falando por mais esse mês.

Hoje você veio falar comigo. De novo. E veio para desmarcar nosso compromisso. Mas não foi só isso. Você fez questão de me explicar o porquê desse infortúnio. Veio me contar que sofreu um acidente, mas não foi só isso. Fez questão de citar que estava levando uma garota para jantar e que ela usava um sapato delicado na garupa de sua moto quando um carro fechou vocês, fazendo com que caíssem, sofressem um acidente. Fez questão de me acalmar, dizendo que a moto foi destruída, mas que você está bem e que a garota apenas sofreu uma pequena lesão no pé (por conta do tão delicado sapato) e que se sente culpado sem razão de sê-lo. Você abriu seu coração para mim. Quase que como amigo. Amigo que jamais será, amigo impossível de ser. Você me contou da garota e assim se referiu a ela: “garota”. Não consigo imaginar o porquê disso. Talvez quisesse mesmo que eu soubesse da existência de uma pessoa importante, pela qual você se preocupa, pela qual se locomoveu quilômetros e para a qual pagaria o jantar. Tudo bem. Eu já sabia. Você, mesmo que quisesse me machucar com isso, não poderia mais. Talvez eu até precisasse saber de você e não ter que ficar fuçando, como uma detetive em busca de provas, uma parte da sua vida que um dia me pertenceu.

Hoje você veio falar comigo. De novo. E veio desmarcar nosso compromisso. Mas não desistiu da conversa depois de cumprir sua obrigação de me avisar com antecedência. Ao mesmo tempo que te vejo me afastando e deixando claro certos assuntos e certos limites, te vejo brincando, te vejo interessado. Quer saber da minha vida, quer ouvir minhas histórias, parece torcer por mim. Você se mostra muito solícito, muito compreensivo e faz por mim favores que estão ao seu alcance. Também deixou muito explícito que gostaria que esse contato se tornasse constante e que se esforçará para remarcar nosso compromisso o mais breve possível. Talvez você só mantenha por mim um apreço e um respeito que, de fato, me é merecido. Talvez. Já entendi meu lugar nessa história toda, pelo menos por enquanto. Eu sei que aquela a quem você se referiu como “a garota” também é quem você chama de “amor” nos meios que você sabe que vejo. E, pela primeira vez, tudo bem.

Hoje você veio falar comigo. De novo. E veio desmarcar nosso compromisso. E então, depois de tentar entender se aquilo era bom ou ruim, depois de ter que suportar você me confessando a vida amorosa e depois de aproveitar e desfrutar de uma parte simpática e atensiosa sua da qual tenho tantas saudades, tive vontade de te dizer que gosto de ser sua amiga. Tá bom, sejamos claros: não sou sua amiga. Mas tive na ponta da língua o discurso que diz, basicamente, que gosto de você. Independente da intensidade desse “você”, que gosto de te ter por perto e de conversar com a sua pessoa. Hoje não importou tanto se estava mesmo compromissado, se não quer mesmo nada comigo e se não vamos nos ver no domingo para o qual estava me preparando. Hoje só importou a companhia agradável, as risadas, a conversa saudável. Hoje só importou você, e não o você que me desespera, mas o você que me conforta, que me acalma e me traz paz. Se eu tivesse que te descrever para alguma amiga agora, seria assim: “Ele tem um poder sobre mim que não sei explicar. Ele me faz querer ficar perto dele, independentemente do que esse ‘perto’ possa ou deva significar”.

A.

quinta-feira, 11 de março de 2010

Ao sair da escuridão, as coisas como elas são

Tenho uma teoria sobre o fundo do poço e sua mola.

É chegada uma hora em que não dá para ficar pior. É aí que você finalmente alcançou o fundo do poço. O tombo, o cair é a parte mais dolorosa. É o momento em que tudo vai ficando mais escuro gradualmente e isso pode levar muito tempo. É desesperador, é como olhar para o lado e enxergar paredes invisíveis. São as paredes de uma bolha do próprio problema, do sofrimento e para onde quer que você vá, a bolha vai com você.

É como não conseguir tocar os pés no chão e navegar num céu eterno. Mas não é o céu como o idealizamos. Isso é estar apaixonado, perdidamente apaixonado e não ser correspondido. É como uma faca atravessando o coração muito lentamente, de maneira que você sente as veias e artérias se rasgarem e serem atravessadas em câmera lenta, uma a uma. E essa dor parece que não vai passar nunca.

Chegar ao fundo do poço, diferente do que a maioria pensaria, não é a pior parte.

Chegar ao fundo do poço é a solução. Quando se alcança o fundo, mas o fundo mesmo, de terra, só há duas possibilidades: ou se morre, soterrado. Ou se levanta, de vez. A terra maciça que permeia o final do tombo tem uma mola. Quando já não se tem mais para onde cair, só se resta levantar. E a mola te empurra, com toda força, para o nível do chão, para a sanidade mental de novo.

Hoje eu cheguei ao fundo do poço. Ao fundo do seu poço. E depois de tanta gente me avisar e me aconselhar, eu entendi. Sozinha. Você não está nem aí mesmo. Por mais que tivesse puxado assunto, não se lembrava da última conversa. E lá fui eu, no momento em que sabia que estava falando com ela, falei com você. Que foi indiferente, nem ligou. Falei asneiras, coisas sem nexo. Essa é a pior parte da paixão: falar coisas sem nexo. Tudo o que eu falei não fazia sentido. Nem para mim. E poderia ter um porquê se você ajudasse. Mas você me deixou ali, sozinha, confusa, atrapalhada, perdida nas minhas próprias palavras sem sentido, sem nexo.

Me senti um nada. De repente uma onda de racionalidade veio à cabeça. Depois de muito, muito tempo de insanidade. E então eu consegui enxergar a minha situação de fora, como se a alma tivesse abandonado o corpo só para observar a si mesmo. E lá estava ela: uma garotinha perdida, atrapalhada, sem rumo, chorando. Uma pessoa pequena, perdida em si mesma, tentando achar seu caminho no meio de um labirinto sem fim. Teimando em apertar um botão que quebrou, não funciona mais.

E então a alma voltou e contou ao corpo o que vira e eu me olhei no espelho, toda borrada de rímel, descabelada e nada apresentável. Que lamentável! E então eu entrei em sua página de relacionamentos de novo. Sim, entrei. E vi todos os seus recados e todas as suas fotos e me provoquei. Foi como cortar os pulsos. Às vezes é preciso cortar os pulsos para ver o próprio sangue. Para encontrar a realidade.



Estou no fundo do poço, tenho a mola sob meus pés e posso escolher dar o impulso ou morrer soterrada, no fundo, para sempre. Eu fucei os seus recado e suas fotos e descobri que não sei mais nada de sua vida. Eu estou apaixonada por uma lembrança, por pó. Eu preciso seguir em frente. Eu vou dar o impulso. Sim, eu vou te encontrar, eu vou fazer a maldita entrevista. Ainda preciso disso. Preciso olhar para você de novo. Preciso olhar nos olhos de quem me fez tanto sofrer. Preciso não precisar mais. E vai ser te vendo, com todos os defeitos e imperfeições, com todo o sarcasmo e indiferença que te pertencem e que me ferem que o impulso será dado. E então eu encontrarei o chão e a claridade novamente. E a bolha vai se desfazer e a minha alma voltará ao meu corpo. E então eu estarei livre. Com memórias, com histórias, mas livre. Mais sã.

domingo, 7 de março de 2010

Quis nunca te ganhar

Como faz para tirar você dos meus favoritos no e-mail? Toda vez que entro para checar informações importantes, a sua foto tosca brincando de arco e flexa aparece do lado das suas atualizações, que contém, basicamente, com quem você jogou poker pelo msn, o que você escreveu no seu nick e coisas fúteis que não fariam a menor diferença se não saltassem como uma propaganda chata, daquelas que você tem que ficar correndo atrás do “x” com a opção de fechar e acaba desistindo, fechando a página.

Meu dia pode estar ótimo ou péssimo e lá vem você invadir minhas memórias muitas vezes já adormecidas, me fazendo reviver aquele dia do carro, o último dia em que nos vimos, em que a minha última frase foi proferida com palavras de baixo calão: “agora fudeu”, representando o meu desespero por ter me re-apaixonado (se é que isso existe) de vez por você e o medo que isso me causava. E as consequências que eu sabia que viriam. E então, pensando em consequências, me lembro daquele último dia no cinema, em que deitei no seu peito e, enquanto você fazia carinho no meu cabelo, fiquei imaginando que era bem provável que aquilo não se repetisse mais. E em meio a um filme que não me causava interesse algum, quase chorei, sabendo que teria que aproveitar aquele momento ao máximo. Aproveitar o pouco que tinha de você ao máximo.

E minha mente volta àquele banco no shopping, em que ficamos umas 3 horas, chutando por baixo, só segurando nas mãos um do outro, como duas crianças sem graça que não sabem o que fazer. Foi aquele dia que você me pediu um beijo e eu demorei horrores para dá-lo, talvez nem o quisesse. E me arrependo de uma maneira inenarrável de não ter me atirado aos seus braços antes mesmo de você completar o pedido. Quanto tempo eu perdi com você! Cheguei atrasada ao nosso encontro porque fiquei uma meia hora no carro, com a cabeça recostada no volante, em sinal de desespero, sem saber o que fazia alí, que besteira estava cometendo, a quem estava enganando. Eu hesitei. Cheguei a pensar em arrumar uma desculpa, ligar e dizer que algo me impedira de ir ao seu encontro. Mas pensei no quanto você havia se locomovido para ir até mim e me entreguei a você. De novo.

Lembro do dia em que te chamei para tomar um café em casa. Na maneira como você me olhava e me elogiava e sabia o que eu queria. Me lembro de você me fazendo massagem e pedindo para relaxar. E me lembro também do tempo que demorei para me decidir, brincando com pedrinhas que não faziam o menor sentido, dizendo qual era a minha favorita. Aquele tipo de coisa vergonhosa que me dá calafrios quando me deparo com pedrinhas iguais. Você teve que insistir em me beijar. Eu não sabia se queria. Queria, mas não sabia o porquê. Você sempre foi um brinquedinho para mim. Sabia que te tinha nas mãos e o usava quando bem me interessava. Nunca admiti o quanto também era apaixonada por você.

Àquela imagem de você me dizendo ao ouvido “te amo, te amo, te amo” incessantemente e eu confusa e até desconfortável me atormenta. Acho que nunca te falei que te amava pessoalmente. Você nunca ouviu minha voz proferir essas palavras de tamanho significado. Sempre me limitei ao “eu também”. Tinha medo, não sei, não conseguia.

E a vez em que você me surpreendeu? Que apareceu quando disse que não apareceria e minha cara de surpresa foi mais desanimadora do que se fosse ao contrário? Não sei dizer o que se passou pela minha cabeça e então você me surpreendeu de novo, com um presente de dia dos namorados: um coração com braços e pernas e dizeres. Tudo o que eu mais odiava, a única coisa que eu realmente não queria ganhar. E fiquei imaginando o tempo que havia passado cortando coraçõezinhos de pelo menos umas 3 cartolinas vermelhas para enfeitar a enorme caixa que tinha feito com várias lembrancinhas para você. Fiquei com raiva por ter quase certeza de que era a sua mãe quem tinha escolhido o meu presente e nunca consegui olhar para aquele bicho com muito amor. Hoje me pergunto aonde é que ele foi parar e por que o joguei fora. Hoje, daria tudo para ganhar um presente seu, um papel de bala que fosse. E fico imaginando se você ainda tem os bichinhos, os papéis, as lembranças.

Quis te afastar de mim quando fiz intercâmbio. Quis que me esquecesse, que quisesse um outro alguém, que não mandasse e-mail, que não quisesse ouvir minha voz. Não te liguei. Nem ao menos pensei nessa possibilidade. Liguei para pessoas muito menos importantes que você e te decepcionei. Arranquei seu coração com a fúria de um leão faminto. Faminto pela vida e pelas experiências. Queria viver. Achava que em determinado momento encontraria alguém bem melhor que você. Alguém com quem eu fosse casar e viver para sempre. Hoje sonho com o nosso futuro improvável casamento.

Queria morrer quando seu perfume exagerado ficava impregnado nas minhas roupas e hoje caio em prantos quando descubro alguém com aquele cheiro que já saiu de linha, mas continua me atormentando.

Te achava meloso demais, possessivo demais e os planos que você fazia para nós me causava nó no estômago. Você queria viver na praia, surfando. Eu daria continuidade aos negócios da sua família, afinal não teria mercado para a minha área por aí. Teríamos muitos filhos e uma casinha nossa. Você queria que eu fizesse 18 anos logo para amarrar meu burro com o seu. Eu queria a cidade grande, conhecer o mundo, ser importante, bem sucedida e independente. Quanta diferença!

Não te culpo por ter me tratado tão mal. Afinal, fiz de tudo para te perder, para nem ao menos te ganhar. Tive que conquistar o que eu queria para descobrir que o que eu precisava esteve nas minhas mãos por muito tempo e eu joguei sabão, fiz escapar. Hoje mudaria todos os meus planos por você. Too late.

A.

sábado, 6 de março de 2010

Ainda não acabou

Arrumei uma desculpa pra ver você de novo. Inventei uma reportagem, inventei um tema. Fucei todos os lugares em que poderia descobrir coisas novas a seu respeito e tomei coragem para falar com você. O computador sempre faz as vezes de mediador, principalmente quando não temos cara suficiente para encarar a voz ou o olhar. Lá vou eu, começo a conversa com um “é de você mesmo que eu preciso”. A belíssima frase foi proferida com o intuito de pedir uma ajuda profissional. Mas eu e você sabemos que o significado dessas palavras jogadas sem a menor inocência é muito maior e mais complexo que isso.

Ao contrário do que imaginei, você até que foi bem solícito. Ao mesmo tempo, também ao contrário do que imaginei, você não fez nenhuma brincadeirinha, não soltou nenhuma indireta e não me deixou super esperançosa e boba. Simplesmente manteve o foco no profissional e no que poderia me ajudar. Nada mais justo, pois afinal (teoricamente) era isso mesmo que eu queria. E então me pego imaginando se você está mesmo apaixonado por essa menina. Se dessa vez alguém fisgou o seu coração de verdade. E isso me preocupa. Ilusoriamente, sempre me prendo à teoria da minha avó de que os homens conhecem os amores de suas vidas aos 19 anos de idade. Diz ela que se um homem se apaixona nessa idade, é para a vida toda. Foi aos 19 anos que você se apaixonou por mim e esse fato sempre me conforta de uma maneira que nem consigo explicar. É como se pudesse passar 500 mulheres na sua vida, mas eu fui a dos 19 e estarei sempre lá. Pura ilusão. Aquele tipo de mentira que insistimos em acreditar.

Talvez você também pense em mim. Afinal, me respondeu já, quase que horas depois, quando que poderemos nos ver, quando que dá para gravar, já com horário e tudo o mais. Achei que você fosse me ligar. Talvez você também tenha medo de ouvir minha voz. Talvez não esteja nem aí mesmo.

Agora é fato: vou te ver de novo. E não vai ser por acaso, não vai ter uma expectativa avassaladora de ficar olhando para a porta imaginando se você vem ou não. Você estará lá e cabe a mim (e ao interesse da minha matéria) ir até você ou não. Eu vou e imagino direitinho como será (mesmo sabendo que as chances de acontecer dessa maneira são praticamente nulas):

Chegarei antes que você ou bem depois. Vou linda. Com a roupa que mais me emagrece, com o cabelo que mais me favorece e com o sapato que me faz andar mais bonito. Vou passar horas me arrumando de uma maneira que faça parecer com que nem me preocupei, que sou linda assim mesmo, que acordo assim. (tolices que toda mulher faz). Vou ser uma pessoa simpática, compreensiva, interessada e engraçada. Tudo isso com um quê sexy no olhar. Meu maior medo é a menina estar lá. Pior: meu maior medo é você se mostrar extremamente apaixonado por ela. Se isso acontecer, é ir pro banheiro cortar os pulsos e chorar. Não, calma. Se isso acontecer, é continuar sendo a pessoa mais simpática, interessante e legal do universo.

Aí então, depois da entrevista, depois de conhecer seus novos amigos e me mostrar a pessoa mais interessada do mundo no esporte que você pratica, queria que você me chamasse para tomar um café ou sei lá, almoçar, jantar, conversar, dar uma volta no shopping. Qualquer coisa que envolva só eu e você. Tá, contando que isso não vai acontecer, pretendo só te entregar o livro que comprei e dizer “ah, só mais uma coisa...Comprei esse livro para você há um tempo atrás e não tive a oportunidade de te entregar. Bom, sei lá, se você quiser, é seu” ou algo do tipo. E então você vai aceitar e eu espero que coloque na sua cabeceira, que leia, que ame o seu conteúdo e que lembre de mim a cada vez que olhar para ele, a cada página que você devorará.

Não sei o que vai acontecer. Não sei se tudo isso é só fantasia. Não sei o que você sente ou deixa de sentir. Só sei que eu ainda amo você e isso é só mais uma tentativa de me manter perto, presente na sua vida. De não deixar você me esquecer, de não me deixar te esquecer.

Só sei que eu quero te dizer mesmo, depois de um tchau com um olhar 43 bem menos brega e mais demorado, é: “A gente ainda vai casar. Pode ser que a gente tenha 90 anos, pode ser nosso sétimo casamento. Não importa. Mas a gente ainda vai casar. Eu não vou morrer antes de casar com você e você, por favor, tente não morrer também.”, virar as costas e ir embora, sabendo que deixei em você uma marca como deixei das outras vezes e saber que a minha certeza sempre certa (com a qual você tanto se impressionava) vai martelar na sua cabeça por um bom tempo. Até que a vida se prontifique a arrumar uma desculpa para nos encontrarmos de novo.

A.

terça-feira, 23 de fevereiro de 2010

Só um recadinho, professora




Olá, Professora, tudo bom?

Não sei se você se lembra de mim, fui sua aluna no semestre passado. Não fui a que tirei a melhor e nem a pior nota nas suas provas, não me destaquei nem por bem e nem por mal. Mas posso te garantir que se alguém soube apreciar sua aula, esse alguém fui eu. Meu intuito com esse e-mail não é parecer prepotente, deixe-me explicar.

Estava esperando anciosamente pelas suas aulas no próximo semestre (o meu sexto), mas ouvi rumores de que é possível que você não fique mais por aqui. Então achei que era, por direito, te deixar saber a extrema importância que as suas aulas tiveram (e ainda têm) em minha (ainda em andamento) formação e meu crescimento como pessoa mesmo.

Muitos reclamavam de suas aulas e diziam que você, apesar de ser muito inteligente e exalar conhecimento, não conseguia ser linear em suas explicações e confundia a cabeça de todo mundo. E o trabalho que tínhamos que lhe entregar, então? Esse foi motivo de muitas noites regadas a pó de guaraná e muito desespero (e digo isso por experiência própria).

Porém, aprendi, ainda no começo do semestre, a entender sua maneira de ensinar e absorver tudo aquilo que você tinha para nos passar. Eu era uma aluna que sentava sempre e impreterivelmente em sua frente e fazia anotações de maneira frenética, sem deixar passar nenhuma vírgula de suas explicações. E pronto! Me achei!

A partir do momento em que consegui prestar atenção e absorver sua aula e todos os conteúdos, não tive mais nenhuma dificuldade. Me impressionava o tanto de livros de cor e salteado que você tinha na cabeça (não só o nome, mas também o autor e, não muito raro, algum trecho mais interessante). Saía de sua aula extremamente fascinada com a sua inteligência e, ao mesmo tempo, me sentindo a pessoa mais burra desse universo por não conhecer nem um terço daquele monte de variados assuntos que você parecia dominar com tamanha facilidade.

Essa seria uma revelação um tanto quanto tosca, se fosse só isso (mesmo porque, imagino que essa seja uma constante observação de muitos dos seus alunos. Portanto, nada novo pra você), mas fico muito feliz de poder lhe dizer que não é.
Ficava perturbada, pensando no quão desinformada (talvez desinteressada seja a palavra correta) eu era e o mar de coisas que eu ainda tinha para aprender, o tanto de livros que ainda havia para ler (e eu que achava que lia muito!).
Resolvi tomar uma atitude e tive você como parâmetro. Ao fim de suas aulas pensava: "Quando crescer, quero ser igual a ela!" (não que eu seja muito mais nova) e anotei cada autor e cada livro citado por você. Li todos.

Resultado: Gay Talese é hoje um dos meus autores favoritos e hoje, por sua causa, tenho certeza de que estou no caminho certo, no curso certo. E, assim que caiu o diploma, no finalzinho do semestre e das suas aulas, nem pensei na possibilidade de deixar o curso. Hoje me sinto jornalista e tenho certeza que ainda serei muito boa naquilo que pretendo fazer para o resto de minha vida e devo grande parte disto a você.

Sempre pensei em te falar isso, mas sabe como são as coisas, deixamos tudo para depois. Também pensei que talvez fosse um pouco piegas demais e meio sem necessidade. Todavia, imaginei que se fosse professora, gostaria de saber que ajudei uma aluna a ser melhor (profissionalmente, como aluna e como pessoa) e que meu
trabalho rendeu frutos fora de sala de aula.

Não sei quais são os seus planos e gostaria muito de ser sua aluna novamente. Mas se for melhor pra você seguir outros rumos, então desejo que assim o faça, sabendo que passou pelo caminho de muitos alunos e que muitos deles foram tocados e influenciados (de maneira positiva) por você. Desejo, de coração, que você seja extremamente feliz em qualquer decisão e caminho que tomar e que colha bons frutos de tudo o que vem plantando.

Desculpe-me pelo e-mail repentino, meio sem sentido e enorme (tenho sérios problemas com textos gigantes). Só queria mesmo te agradecer por ter me ajudado sem nem saber que o fazia!

Boa sorte e espero te encontrar ainda, como aluna ou colega de profissão! =)

Obrigada, de verdade.

Atenciosamente,

A.

quarta-feira, 17 de fevereiro de 2010

Juntando sonhos num cofrinho



Quando vi o trailer de Up, altas aventuras, já o anotei na minha listinha de filmes que não poderia deixar de assistir. A animação continha os três elementos que eu mais gosto: um velhinho rabugento que se torna o vovô fofinho, uma criança gordinha e ingênua e um sonho. Isso tudo misturado com muitos balões coloridos, uma casa que voa e um animalzinho de estimação. Tentei de tudo mas não consegui assistir ao filme quando este ainda estava nas salas de cinema. Esqueci. Mas num voo de 8 horas ele se lembrou de mim. Pela primeira vez, eu estava realmente feliz em não ter o mínimo de sono dentro do transporte que, por mais que seja o mais seguro do mundo, me apavora tanto.

Tirando a meia horinha do que os comissários de bordo têm coragem de chamar de janta e a tentativa sem sucesso de tentar fazer a criança do meu lado parar de chorar, teria tempo de sobra para apreciar um filminho light, de sessão da tarde, para crianças. Supostamente para crianças. Fiquei em choque. Quando o letreiro apareceu na tela preta, não sabia se tentava dormir de indignação ou chorava. Que raios de filme para criança tão violento, real e sem final feliz era esse?
Depois de muita frustração (por não conseguir dormir e por não ter gostado da única coisa que me animara naquele voo) e em meio a uma área de turbulência, pensei. Acho que esse filme foi feito para adultos. Mesmo. Imagino que se meu pai o tivesse assistido poderia me dar uma explicação que faria incontestável sentido e que deixaria o filme belo e até poético.

Um menino encontra uma menina que passa a ser o seu mundo. Ela é faladeira, tem muitos sonhos e um brilho lindo no olhar. Ele é quietinho e não tem muitas motivações. Um completa o outro. Até aí, tudo bem. Nada que já não tenha visto ou vivido antes. Mas a parte que mais me chama atenção é a parte do cofrinho. Eles juntam moedas com muito suor em busca de um sonho, mas precisam usá-las para consertar o carro, pagar a conta do hospital, comprar um sofá novo. A realidade sempre quebra o cofrinho. Meu pai acharia isso bonito. Acho que adultos sabem que é assim que a vida funciona. Que sonhos são para ser sonhados e muitas vezes não realizados. Mas eu não. Pode me chama de ingênua, mas eu ainda sonho muito. Ainda acredito que os meus velhos planos de mudar as pessoas e conhecer o mundo podem ser concretizados. Tá aí: velhinhos rabugentos e fofinhos podem ser crueis.

Depois de muita violência e mais decepções ao longo dos longos minutos de filme, por fim o fim e mais uma quebrada de pernas: não, o pai do menininho fofinho não vai se conscientizar que tem um filhinho lindo e bom e não, ele não vai comparecer ao que era o mais importante para a coitada da criança. Ai, como o mundo é frio.

Desliguei a TV do avião me perguntando como que o menininho fofinho e decepcionado pelo pai ainda sorria pelas ruas da cidade, tomando sorvete com aquele velhinho rabugento que a princípio nem o queria em sua vida. A vida é dura e pega nossas moedas dos sonhos, mas ainda se pode ser feliz¿ Acho que o menininho gordinho e ingênuo mostrou ao velhinho rabugento que ainda se pode sonhar e o transformou num vovô fofinho. E acho também que o já transformado vovô fofinho mostrou ao menininho gordinho e esperançoso que sempre terá alguém ao seu lado, por mais que não seja quem você imaginava.

É, acho que posso conviver com isso. Mas, ainda assim, não quero que a realidade venha quebrar o meu cofrinho.

A.

domingo, 7 de fevereiro de 2010

Finalmente, ao som de Kid Abelha

Fiz academia, mesmo detestando. Convenci todo mundo a me acompanhar e me dar carona, mesmo com a chuva, os alagamentos e a pouca vontade de ir no maldito aniversário em que teríamos que deixar nossas calças para pagar a conta. Coloquei minha saia mais curta e a minha meia calça mais fina. Comecei a me arrumar 3 horas antes. Fiz chapinha, baby liss , limpeza de pele e branqueamento nos dentes. Pintei as unhas de vermelho (Doce orgulho e atração fatal, uma combinação num tom vinho puxado pro vermelho sangue, pra combinar com a situação), fiz as sobrancelhas e até me depilei. Treinei andar de salto alto e aprendi aquela maquiagem complicada. Estava pronta para te encontrar e mostrar tudo o que você perdeu. Me preparei psicologicamente até para encontrar sua nova garota: seria a pessoa mais simpática e interessante do mundo e não deixaria me mostrar abalada.

Sabia que você estaria lá, fucei no seu orkut e no da sua menina. Subi as escadas triunfante, sem medo de nada. Cheguei antes. Sentei no melhor lugar, com visão do salão inteiro e o salão inteiro podia me ver. Sorri, achei tudo engraçado, era a pessoa mais legal do mundo. Recebi elogios por minha atitude e por minha aparência. Sabia que sairia dali me sentindo muito bem e pronta para seguir minha vida. Sabia que o que precisava era ver você mais uma vez e me deixar ser vista como sou (e um pouco mais) e não aquela pessoa ciumenta, possessiva , controladora e desesperada com quem você terminou o relacionamento por e-mail. Quando isso acontecesse eu poderia finalmente entender que sou boa o bastante para você e até mais: entenderia que você não me merece. Depois de mais um ano, dos quase 5 que se passaram, eu estaria livre e pronta para recomeçar.

Meus planos começaram a ruir quando fui mudada de mesa. A única coisa que não queria fazer, fiz: sentei no tatami, com medo de todo mundo enxergar o meu útero (por causa da mini saia) e não pude levantar de lá nem para fazer xixi. Passaram-se 2 horas e eu ainda tinha certeza de que você apareceria. Quando estava na sobremesa, suada, morrendo de calor, desconfortável e com dor nos pés, soube que você não iria. Parei de fazer gestos graciosos, de rir com empolgação, mas em nenhum momento consegui tirar os olhos da porta. A esperança é sempre a última a morrer.
Cantei parabéns, falei tchau e desci para pagar a conta. Fiz uma piadinha e levei uma cantada discarada do amigo da aniversariante, dono do restaurante. Poderia ganhar o jantar e mais uma saquerinha se aceitasse o convite para ficar e conversar um pouco. Quis ir para casa. Dei um sorriso xoxo, arrumei qualquer desculpa esfarrapada e fui esperar pelo carro, sozinha. Mesmo do lado de fora do restaurante, achei que pudesse te ver, atrasado, correndo, depois de pegar trânsito ou qualquer possibilidade que minha cabeça criou. Nada. Quis muito ir para casa.

Você quebrou minhas pernas, mesmo sem nem saber. Juro que não sei como você consegue fazer isso. A sua não-aparição me deixou mais ligada ainda a você. Fiquei pensando em como teria sido, mas não foi.

Tinha muito sono, mas não conseguia dormir. Desde quando você me mandou o ingrato e-mail eu não tinha chorado. O aperto no peito era desesperador, mas as lágrimas insistiam em não correr pelo meu rosto. Essa foi a noite em que eu finalmente desabei. Consegui dormir porque já estava cansada demais de chorar.

Acordei com dor de cabeça de ressaca. Ressaca de você. Ressaca do sofrimento que você me causou. Ressaca de chorar. Não quis sair e a casa ficou só para mim. Coloquei meu bikini, resolvi pegar uma cor. Preparei uma taça com muito gelo e água, bonita de se ver e gostosa de beber. Coloquei as minhas músicas favoritas e chorei. Por 3 horas e meia. Fiquei exausta. Pensei em ligar para a minha mãe e contar tudo, coisa que nunca fiz. Resolvi escrever. A música rolava e então começou a tocar “Lágrimas e chuva” e a voz me era familiar: Paula Toller. Desde quando você me disse que ao ouvir Kid abelha lembrava da menina a quem eu temia te roubar de mim, me dava um arrepio dolorido e bem desagradável ao ouvir todas as letras e todas as melodias que um dia gostei tanto.

Dizem que o primeiro passo para se recuperar é a raiva e o fato de você me ter tirado a música me dá muita raiva. Você não tinha esse direito e esse não é o tipo de coisa que se diz para alguém que gosta da gente. “Lágrimas e chuva” está tocando pela décima vez e acho que eu vou sobreviver a isso. Não sei quanto tempo vou demorar para ouvir “Os outros” – na versão acústica – sem surtar, mas acho que dei o primeiro passo.

Não te vi, não te surpreeendi. Não me recuperei, mas chorei. Coloquei para fora a dor e a culpa. Vou deixar você ser feliz com ela que parece ser uma pessoa legal. Espero que você não a magoe e que não mostre seu lado mau humorado, grosso e quase primitivo de ser. Sei que você vai usar suas técnicas de Jiu Jitsu e sedução para deixá-la boquiaberta e levá-la para a cama. Mas independente do tanto que você conquiste e ame, um dia vai saber que ninguém nunca vai achar tão bom ter um cara grosso ao lado. Que ninguém nunca vai ficar tão surpresa com seus movimentos e músculos e nunca ninguém vai cair tão fácil nas suas táticas de sedução. Nunca ninguém vai ser tão idiota. Você é o cara da minha vida, mas eu sou boa demais para você. Um dia você vai saber. E vai saber também que eu te esperei e fiz muito por você sem você nem imaginar. Um dia você vai saber.

Enquanto esse dia não chega, vou me arrumar para mim e torcer para que o Kid Abelha grave um novo CD.

A.